sábado, 8 de maio de 2010

Batendo perna pela Itália!


Rio de Janeiro, 14 de janeiro de 2004.

Olá, pessoal, chegou o momento de contar em detalhes meus belos dias em Amalfi & Cia. Vou dividí-los em partes para tentar não esquecer nada.

Agruras de uma viajante em uma noite gelada de inverno(literalmente): partindo para o desconhecido.

Dia 24 de dezembro foi, talvez, o dia mais difícil da minha vida. Eu não tinha a menor idéia se conseguiria finalmente pôr fim ao “tranca-aeroporto” que parecia controlar as minhas tentativas de sair do Brasil (sim, porque toda vez que a viagem parecia estar próxima algo acontecia: uma vez foi o exame de qualificação do mestrado e a professora chata da prática de ensino; outra foi o trabalho). Para minha surpresa, tudo foi bastante fácil, a não ser por um susto enquanto eu esperava o embarque: o meu nome foi chamado e, como eu estava levando dois potes de goiabada cascão escondidos na mala, pensei que estava sendo chamada por isso. Não, era só uma das folhas da passagem que não fora retirada(ou uma espécie de 1º de abril atrasado e de mau gosto). A viagem até a França foi tranqüila, sem turbulências, a comida gostosa, o atendimento simpático (principalmente de um gatinho [comissário de bordo] de + - 1,90, que eu, muitíssimo infelizmente, só descobri no dia seguinte e do qual eu falarei mais adiante). Antes devo falar de um casal ao meu lado que é digno de nota: comecei a bater papo com eles (vocês sabem como eu sou quieta e anti-social...) e o homem começou a tentar me convencer de que eu devia largar minha carreira de professora no Brasil para ser empregada doméstica na Itália porque, afinal, lá eu ia ganhar em ‘euro’. O fato de que eu iria gastar em euro para viver era mero detalhe. Veio o jantar (o frango eu não lembro como foi feito, mas havia maionese com salmão defumado [e eu achava que na classe econômica nós passaríamos a pão e água, no intervalo, entre uma batida de asa e outra, como nos navios vikings de desenho animado, com um cara fortão e feio atrás gritando: “remem”, ou melhor, “batam as asas do avião, seus molengas”] e uma torta de queijo com passas maravilhosa (que, para meu deleite, também foi servida na volta, deve ser marca registrada da air france [tomara, aliás, assim quando eu voltar à Itália, se Deus quiser, algum dia, posso comê-la de novo])! O tal homem encheu a cara de vinho (de graça e francês não se despreza, não é mesmo?). Mais tarde, quando apagaram as luzes, eu resolvi tentar dormir e, antes de dormir (com aquela máscara de tratamento de beleza que não deu certo nos olhos), resolvi rezar um pouco. Afinal, em cima do atlântico é bom pedir um pouco de proteção (se o avião caísse, viriam nos atacar uns tubarões chatinhos que comem qualquer coisa e, como não sabem se no dia de amanhã cairá outro avião, devoram até o último pedaço). Qual não é a minha surpresa quando o homem deita a cabeça no colo da mulher (deu para ver pelo canto da máscara) e começa um bate-papo sussurrado, papo de bêbado. Até aí, tudo bem. Ele era um homem de meia-idade. Eu tentei rezar, ele continuou a falar, eu continuei tentando rezar, mas quando ele disse a ela que dalí a pouco era capaz de ter uma ereção, vocês imaginam que eu não pude mais rezar. Quase ri, depois tive vontade de gritar: ‘não vai, não, que isso é proibido aqui!’. Mas se eu fizesse isso, acho que o cara[não exatamente ele..] nunca mais levantaria e a mulher poderia me espancar por cometer crime contra a humanidade. A dela, pelo menos.
De manhã, eu descobri onde estavam escondidos os comissários de bordo bonitinhos: estavam lá no fim do avião. Aliás, solteiras, o point da paquera é lá mesmo, no fim do avião: é onde os comissários são mais “paqueráveis” e é para onde os soltos costumam ir. Pena que eu só descobri isso quando faltavam 4 horas para chegar no Brasil, já na volta, e, no melhor da paquera com um italiano que ia ficar no Ipanema Inn com um amigo por duas semanas (qual era exatamente o relacionamento dos dois, eu não sei), apareceu uma porcaria de uma turbulência e nem mesmo os nossos ‘pleases’ desesperados foram suficientes para nos manter ali. Depois, o mocinho não voltou, só o amigo dele, mas ele se reuniu ao grupo dos barangos e eu não ia me juntar a eles só pra tentar uma aproximação com o cara que nem era o bonitinho. Aliás, outra vez, quem me dera ter sabido disso no meu vôo de ida quando havia um comissário de bordo francesinho fofinho, lindinho que me chamava “L’italienne” e com o qual seria possível viver o romance perfeito, já que ele não falava nem italiano nem português e eu não falava nem francês nem inglês. Afinal, são sempre as palavras que estragam tudo!
Em Paris, tanto na ida quanto na volta, eu tive o meu momento ‘esqueceram de mim’: não que eu tenha sido esquecida ou tenha, tampouco, esquecido algo, mas me refiro à correria. Eu parecia uma maratonista. Como o vôo brasileiro saiu com um belo atraso, eu cheguei no Charles de Gaulle em cima da hora e, para piorar, saí do avião apertadíssima, não pude deixar de ir ao banheiro. Quando eu descia as escadas para ir ao setor de embarque, vi que eram 14:39 e o meu vôo era às 14:55. Pior, tinha de pegar um ônibus que me levaria a um outro hangar onde, então, eu passaria por todos os trâmites ‘embarcatórios’. Aí começou a correria. Meninas, como eu corri! Com uma bota de salto 8 (foi a única que eu achei forrada com lã de carneiro [que, na minha opinião, é um carpet] e no meu número, 34) e com uma bolsa de viagem que, se não estava pesada, também não estava leve e não me ajudava em nada, bem que ela, a bolsa vermelho-bombeiro, poderia ter ido correndo ao meu lado. Consegui, apesar disso, pegar o vôo. Da janela (é, eu fui na janela), eu fotografei os alpes franceses, as fotos ficaram lindas. Nesse vôo, eles serviram uma espécie de carpaccio de salmão, mas eu não comi porque não como nada cru. Chegando em Roma, peguei minha mala (aliás, antes de acertar a esteira, passei por outras duas, ainda bem que a minha mala só apareceu quando eu já havia encontrado a esteira certa) e, sem dificuldades, achei o trem que me levou até a stazione termini. Na estação, eu tentei ligar pra mãe com o cartão da embratel, mas preocupada com a possibilidade de perder o trem, acabei optando por ligar do trem com o celular. Essa decisão me custou, em 6 minutos, R$122,58, mas valeu à pena. No trem eu descobri que ninguém havia carimbado o meu passaporte e por uns tempos fiquei achando que havia entrado ilegalmente na Itália. Já me via sendo carregada para a prisão, torturada à exaustão pra contar onde estavam as substâncias ilegais que eu, meliante proveniente do terceiro mundo, trouxera comigo. E olha que, saindo do aeroporto para a estação de trem, eu vi um cara fardado e perguntei onde eu pegava o visto, mas ele me disse que o visto me havia sido dado no primeiro país da união européia em que eu havia estado, ou seja, França. Aí, ainda no trem, lembrei do papel amarelo que eu preenchi no vôo para Paris e cheguei à conclusão de que agora não carimbam mais, o que é uma injustiça!! Eu quero o meu carimbo!!! Vou fundar o Partido dos Sem Carimbo (PSC) e lançar a campanha do Carimbo Já! Todo cidadão do terceiro mundo tem direito ao seu carimbo. Nós já não temos educação, nem saúde de qualidade, não há emprego, nem perspectiva de um futuro melhor e ainda nos tiram a única coisa que podia nos conferir uma sensação de conforto e igualdade social!!! Que tal? Posso me candidatar nas próximas eleições?

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